Redução não é a solução!

Publicado por Thaynara Policarpo
Campina Grande, 3 de outubro de 2017

A discussão sobre a redução da idade penal e o aumento do tempo de internação para adolescentes infratores está de volta à pauta da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, agora através da PEC 33/2012. Já se sabe que a discussão é fruto de campanhas e projetos patrocinados por setores políticos de atuação reacionária e oportunista, mas que encontra apoio na sociedade, que acredita na punição de adolescente infratores, como forma de diminuir a violência.

Os que apoiam essa proposta desconhecem ou preferem não conhecer as verdadeiras causas da violência no Brasil e as distorções em torno da responsabilização penal de adolescentes. A medida refletiria, necessariamente, no aumento da criminalidade – e não o contrário, como pregam seus defensores. Vejamos sinteticamente algumas das principais questões que envolvem o assunto:

  • Diferentemente do que divulgam, os/as jovens são as principais vítimas da violência no Brasil. Pesquisas oficiais confirmam, para cada adolescente que comete um ato infracional, outros sete são vítimas de crimes praticados por adultos contra eles. O Atlas da Violência 2017, lançado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, lançado recentemente revela que quase metade de todos os homicídios que ocorrem no país é praticada contra jovens com idades entre 15 e 29 anos (47,85% do total de óbitos registrados no período estudado). Um recente relatório da Unesco demonstra que os jovens são as principais vítimas da falta de oportunidades, do desemprego, da exclusão social e, principalmente, da violência. Desse total, 77% são negros e menos de 8% dos casos chegam a ser julgados. O perfil da maioria das vítimas da violência policial e dos grupos de extermínio em todo o país é o mesmo: além de jovens do sexo masculino, são negros e pobres;
  • Apesar dos altíssimos índices de homicídio de jovens negros, o tema é em geral tratado com indiferença na agenda pública nacional;
  • Jovens com idades entre 18 e 25 anos representam 70% da população prisional brasileira, evidenciando que o Código Penal e suas punições não inibem os adultos jovens da pratica de crimes. Portanto também não serviria para intimidar os adolescentes entre 16 e 18 anos;
  • Os partidários da diminuição da redução da maioridade argumentam que o crime utiliza-se da inimputabilidade dos menores de 18 anos para colocá-los à frente de delitos. Ora se ocorresse a pretendida diminuição para 16 anos, o crime passaria recrutar, então, adolescentes, de 14, de 13 anos… Logo, fica patente, que essa lógica não resolve coisa alguma.
  • A questão da inimputabilidade é considerada “cláusula pétrea”, se tratando de direito e garantia fundamental das crianças e dos adolescentes, sendo, portanto, inconstitucional qualquer emenda visando à modificação, conforme pode-se verificar nos artigos 5o, 228 e 60, parágrafo 4o, inciso IV da Constituição Federal;
  • O Brasil ratificou a Convenção da ONU (Organização das Nações Unidas) de 1989, que define como crianças e adolescentes todas as pessoas com menos de 18 anos de idade, que devem receber tratamento especial e totalmente diferenciado da pessoa adulta;
  • Circula nos meios de comunicação a falsa informação de que adolescentes não são responsabilizados quando comentem infracionais. Na realidade, eles/as são devidamente responsabilizados/as, mas não pela lei penal e sim pela legislação especial (Lei 8. 069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente), que prevê no artigo 112 as medidas socioeducativas, que não vislumbram só a punição, mas principalmente a reeducação e socialização de adolescentes que cometem atos infracionais. Resta cumprir o que preconiza a Lei;
  • Os crimes graves atribuídos a adolescentes no Brasil não ultrapassam 10% do total de infrações. A grande maioria (mais de 70%) dos atos infracionais, são contra o patrimônio, demonstrando que os casos de infratores considerados de alta periculosidade e autores de homicídios são isolados e o ECA já prevê tratamento específico para eles;
  • Alguns países que reduziram a idade penal, como a Espanha e Alemanha, verificaram um aumento da criminalidade entre os adolescentes e acabaram voltando a estabelecer a idade penal em 18 anos (como mais de 70% dos Países do Mundo) e um tratamento especial, com medidas socioeducativas, para os jovens de 18 a 21 anos.

Vale dizer que essa proposta, em última instância, tem o sentido de culpar e punir o povo, sobretudo suas parcelas mais pobres, que em si é a principal vítima da violência. Em última instância é uma forma de encarcerar a pobreza. Filhos de quem, netos de quem seriam atirados aos infernos que são hoje os presídios brasileiros?

Como base nessas informações, será que vale a pena investir no encarceramento da pobreza ou cumprir o que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, garantindo a prioridade absoluta, inclusão social e os direitos da infância e juventude brasileiras? Afinal, redução não é a solução!

Ana Patrícia Sampaio
Coordenadora do Programa Juventude e Participação Política do Centrac