23 de setembro é o Dia Internacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, e para lembrar a data a Campanha “Não deixe que explorem seus sonhos”, está lançando um vídeo de alerta para o risco de aceitar propostas sedutoras de trabalho no exterior. O vídeo, que tem duração de 1 minuto e meio, foi produzido em Campina Grande e será divulgado através da internet.
A Campanha é uma ação do eixo “Direitos das Mulheres” do Programa Mercosul Social e Solidário – PMSS, uma plataforma de ação política integrada por 17 Organizações Não Governamentais e cerca de 400 organizações sociais de países da região do Cone Sul (Brasil, Paraguai, Uruguai, Argentina e Chile). No Brasil o Centro de Ação Cultural (CENTRAC) atualmente está à frente da coordenação nacional do PMSS.
O objetivo da ação é alertar possíveis vítimas sobre o crime de tráfico e também sensibilizar órgãos públicos a desenvolver ações que contribuíram para diminuir, proteger, prevenir ou atender mulheres e meninas vítimas de tráfico; ações voltadas para a perseguição e sanção dos exploradores e traficantes e iniciativas para acabar com a demanda e o consumo de prostituição na região.
Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), todos os anos cerca de quatro milhões de mulheres são vítimas de tráfico para exploração sexual e dois milhões de meninas com idade entre cinco e 15 anos são levadas para a indústria do sexo. Mulheres e meninas representam 86% das vítimas de tráfico de seres humanos. Hoje a internet é uma grande facilitadora deste crime.
Confira os alguns dados do último relatório elaborado pela Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça (SNJ/MJ), em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC):
Entre 2005 e 2011 a Polícia Federal (PF) registrou 157 inquéritos por tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual, enquanto que o Poder Judiciário, segundo o Conselho Nacional de Justiça, teve 91 processos distribuídos. Os dados constam no primeiro relatório com a consolidação das informações existentes sobre o Tráfico de Pessoas no Brasil elaborado pela Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça (SNJ/MJ), em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
Os números ainda revelam que foram instaurados no total 514 inquéritos pela Polícia Federal entre 2005 e 2011, dos quais 13 de tráfico interno de pessoas e 344 de trabalho escravo. “O estudo mostra que o sistema de justiça criminal funciona como um funil. Deveria ser um processo distribuído pra cada inquérito. No caso dos inquéritos de tráfico internacional realizados pela PF e dos processos distribuídos no poder judiciário, funciona na razão de dois pra um”, explica o secretário Nacional de Justiça, Paulo Abrão.
O relatório elaborado entre os meses de maio a setembro de 2012 recuperou estatísticas, sobretudo criminais, sobre o tráfico de pessoas no Brasil. Órgãos vinculados ao Ministério da Justiça, como o Departamento de Polícia Federal, Departamento de Polícia Rodoviária Federal, Departamento Penitenciário Nacional, Defensoria Pública da União e a Secretaria Nacional de Segurança Pública, além dos organismos que atendem diretamente vítimas de tráfico de pessoas, como a Assistência Consular do Ministério das Relações Exteriores, foram entrevistados e forneceram dados. Também foram ouvidos o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho Nacional do Ministério Público.
Quanto a prisões e indiciamentos, no período entre 2005 e 2011, a Polícia Federal indiciou 381 suspeitos por tráfico internacional de pessoas para exploração sexual. Desse total, 158 foram presos. Ou seja, menos da metade dos crimes levou à punição do criminoso. O relatório aponta que há uma dificuldade em reunir provas do crime, o que dificulta a punição. O registro do tráfico também é dificultado pela própria legislação penal, que é inadequada, pois prevê somente o tráfico para fins de exploração sexual, deixando a margem do sistema outras modalidades como o tráfico para fins de remoção de órgãos, tecidos ou partes do corpo e o tráfico para fins de trabalho escravo.
No contexto do tráfico interno de pessoas para exploração sexual foram 31 indiciados pela PF e 117 presos, entre 2005 e 2010. Nesse caso o número de presos foi maior que o de indiciados, o que pode demonstrar que há um intervalo entre o indiciamento e a condenação. “Aqueles que são indiciados em um ano, nem sempre serão condenados no mesmo ano, podendo haver um grande espaço de tempo”, informa a consultora contratada para o desenvolvimento do relatório, Aline Birol.
O estudo conclui que há uma dificuldade dos órgãos que lidam com esse crime em registrar essas informações. “Não há uma cultura em registrar o fenômeno, os sistemas são usados para registrar o trabalho das instituições, mas não para registrar o número de pessoas, de casos”, alerta a diretora do Departamento de Justiça, Fernanda dos Anjos. Por esse motivo, o Ministério da Justiça lança uma metodologia integrada de coleta e análise de dados e informações sobre tráfico de pessoas.
Números do tráfico de pessoas
Segundo relatório do Sistema Nacional de Estatísticas de Segurança Pública e Justiça Criminal (SINESPJC) da Polícia Militar, houve 1.735 vítimas de tráfico interno de pessoas para fins de exploração sexual, entre 2006 e 2011. A consultora Alline Birol ressalta que embora os dados de vítimas de tráfico interno sejam maiores que os de tráfico internacional, “não é possível apontar que haja mais ocorrências de um do que o de outro. Os inquéritos instaurados podem referir-se a mais de um caso”, informa.
Disque Denúncia
Outro dado inédito revelado é o número de ligações de vítimas de tráfico de pessoas recebidas pelo ligue 180 da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres. Em 2011 foram 35 ligações. O disque 100 da Secretaria de Direitos Humanos também recebeu 35 ligações no mesmo ano, e as unidades da rede de saúde (segundo dados do Ministério da Saúde) atenderam 80 vítimas de tráfico de pessoas.
Outros dados
O estudo aponta ainda que a maior incidência do tráfico internacional de brasileiros ou brasileiras é para fins de exploração sexual. De 475 vítimas identificadas pelo Ministério das Relações Exteriores, entre os anos de 2005 e 2011 em seus consulados e embaixadas, 337 sofreram exploração sexual e 135 foram submetidas a trabalho escravo.
Os países onde mais brasileiros e brasileiras vítimas de tráfico de pessoas foram encontradas são: Suriname, Suiça, Espanha e Holanda. O país onde foi registrada uma incidência maior de brasileiras e brasileiros vítimas de tráfico de pessoas foi o Suriname (que funciona como rota para a Holanda), com 133 vítimas, seguido da Suíça com 127, da Espanha com 104 e da Holanda com 71.
As vítimas
De acordo com o Ministério da Saúde, as vítimas que procuram os serviços de saúde são na maioria mulheres na faixa etária entre 10 e 29 anos. Há uma maior incidência de vítimas (cerca de 25%) na faixa etária de 10 a 19 anos, de baixa escolaridade e solteiras.
Perfil do traficante
Dados da PF revelam que são as mulheres em maioria as aliciadoras, recrutadoras ou traficantes, que somam cerca de 55% dos indiciados. Já o Departamento Penitenciário revela um número maior de homens presos por atividades criminosas relacionadas ao tráfico de pessoas. No Ministério da Saúde, cerca de 65% dos casos de agressão a vítimas de tráfico de pessoas foram cometidos por homens. Finalmente, o diagnóstico revela a fragilidade dos dados sobre tráfico de pessoas, pois há instituições que ainda não estão preparadas para registrar esse tipo de crime, contribuindo para a subnotificação.