Organizações de mulheres do campo e da cidade, movimentos sociais, sindicatos, associações, partidos e entidades da Paraíba realizaram no dia 18 de julho, um encontro estadual preparatório para a Marcha das Margaridas 2019, que acontecerá em Brasília-DF nos dias 13 e 14 de agosto. O evento reuniu 170 mulheres e aconteceu no Centro de Formação Elizabeth e João Pedro Teixeira, no município de Lagoa Seca, no Agreste do Estado.
Giselda Bezerra, do Polo da Borborema, deu as boas vindas e falou sobre a importância da aliança entre campo e cidade diante do momento atual: “Nós estamos em tempos não muito bons, mas estamos resistindo a tudo isso. Desde janeiro, estamos participando de processos preparatórios, bebemos de nossas experiências e elas nos trouxeram até aqui. O tempo é de unificar, por isso esse encontro hoje é tão importante, precisamos resistir juntas”, disse.
Na sequência, houve a exibição do vídeo “Mãe Terra” (1987) que retrata o cotidiano duro da mulher trabalhadora rural no Brejo da Paraíba, Sertão e Mata de Pernambuco no final dos anos 1980. O vídeo foi capaz de recuperar o contexto político e social da época em que militou Margarida Maria Alves. O documentário gravado quatro anos após sua morte, foi produzido pela TV VIVA e pelo Centro de Cultura Luiz Freire.
Em seguida, uma mesa de diálogo trouxe os depoimentos de Maria Soledade Leite e Carmelita Pedrozo, duas mulheres que militaram ao lado de Margarida Maria Alves e de Penha do Nascimento nos anos 80 em Alagoa Grande. Participaram ainda da mesa Ana Paula Romão de Souza Ferreira, professora do Departamento de Habilitação Pedagógica do Centro de Educação da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), pesquisadora da vida de Margarida Maria Alves, e Dilei Schiochet do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra da Paraíba (MST-PB).
Maria Soledade Leite, de 76 anos, trabalhadora rural aposentada e violeira, emocionou a plenária compartilhando suas histórias e lições que aprendeu ao lado de Margarida e de Penha: “Elas ajudaram muitas mulheres e se libertar, eu fui uma delas. Aos 19 anos, peguei uma viola e resolvi desafiar a sociedade, abracei uma arte que era só dos homens. Não sabia nem falar direito, mas quando pegava o violão, eu falava cantando. Margarida chegou pra mim e disse ‘pega teu violão e vem lutar’, assim eu fiz”, lembra.
“Eu, assim como Margarida, não tenho estudo, mas não tenho medo. Pode vir o bacharel que for, que não me intimido, eu posso não falar a língua deles, mas sei falar a língua do meu povo, dos trabalhadores, e devo tudo isso à Margarida. Ela não morreu de graça, morreu porque lutou para que a filha do trabalhador tivesse a mesma chance que a filha do doutor”, afirmou.
Carmelita Pedrozo, também lembrou a consciência que Margarida tinha da importância de uma educação libertadora: “Já naquela época, ela defendia uma escola que ensinasse a partir da realidade dos trabalhadores, que lá eles aprendessem sobre os seus direitos”, disse. Ela também falou sobre como foi duro enfrentar a opressão e o machismo juntos “Lembro que nós, quando saíamos nas casas, tínhamos que ir falar sempre primeiro com os homens, muitas vezes, a mulher nem vinha para a sala, pois o dono da casa era o homem, mas não desistimos, a gente ia, conversava. Dei aula no Mobral e em minhas aulas, falava dos direitos”.
‘Margarida soube ser direção sem deixar de ser base’
A professora Ana Paula Romão, autora do livro “Margarida, Margaridas” (Editora UFPB), falou sobre o legado de Margarida para o chamado feminismo camponês: “Paulo Freire dizia ‘a cabeça pensa onde os pés pisam’, e qual era o chão de Margarida? Ela falava do lugar de uma mulher simples, do campo. Uma mulher que soube ser direção, sem deixar de ser base. O sindicalismo rural foi criado para matar as Ligas Camponesas, assumindo um papel assistencialista, o de dar a ambulância, e Margarida surgiu nesse processo, ela rompeu com isso, justamente pelo caminho da educação e da formação”.
Dilei Schiochet encerrou a mesa falando dos desafios da conjuntura atual e do papel decisivo das mulheres: “No momento histórico atual, não acredito que possa haver um levante popular que não venha das mulheres. As mulheres e as juventudes são o futuro desse país”. Após a mesa houve um rápido debate onde algumas participantes se colocaram. Maria de Lourdes Sousa, mais conhecida como dona Quinca, de 70 anos, assentada no município de Remígio, falou sobre o significado da luta para sua vida: “Nada foi dado de presente, tudo que conseguimos foi na luta, foi saindo de casa em casa, fazendo assembleia, estudando os nossos direitos. Eu desde os 12 anos que pelejo, e digo mais, quem morre de medo não sabe do que morreu”, concluiu.
No período da tarde, Ana Patrícia Sampaio, do Centro de Ação Cultural (CENTRAC) relembrou os 10 eixos temáticos da Marcha das Margaridas 2019 e a importância de cada um na pauta da Marcha. Na sequência, as mulheres se dividiram em grupos de cochicho para responder as seguintes questões: “O que levamos de propostas para a Marcha das Margaridas?” e “Como vamos consolidar o movimento de mulheres do campo e da cidade na Paraíba após a Marcha?”.
Desse momento foram tirados alguns encaminhamentos como a reativação do Coletivo Estadual de Mulheres do Campo e da Cidade; a realização de um encontro de planejamento após a Marcha; a escolha de nomes de mulheres do coletivo para disputarem candidaturas nas próximas eleições e o apoio nos estados às mobilizações pela educação do dia 13 de agosto, entre outras propostas.
Foi feito então o repasse das principais orientações às participantes que irão nas caravanas até Brasília e a situação das negociações dos apoios para o financiamento dos ônibus, a meta é de que a Paraíba consiga levar até oito veículos. O encontro foi finalizado com um Toré conduzido pelas mulheres indígenas da etnia Potiguara que participaram do Encontro.
Texto: Áurea Olimpia.
Fotos: Áurea Olimpia, Joana Darc da Silva e Palloma Pires.