Produzir sementes de variedades crioula para abastecimento ou manutenção dos Bancos de Sementes Comunitários de forma a favorecer a autonomia e a soberania alimentar e nutricional são alguns dos objetivos do Projeto Agrobiodiversidade do Semiárido, desenvolvido pela Aspta – Agroecologia em parceria com o Centro de Ação Cultural – Centrac nos territórios da Borborema e do Fórum de Lideranças do Agreste – Folia.
Na manhã da última sexta-feira, 18 de dezembro, a equipe do projeto realizou uma oficina para implementação do campo de multiplicação de milho crioulo no Assentamento Dom Marcelo, município de Mogeiro-PB, região do Agreste Paraibano. Desde a segunda-feira, 14 de dezembro, os agricultores e agricultoras do assentamento se organizaram e deram início aos primeiros passos para implementação do campo, que consiste na instalação da caixa d’água, cercamento da área, preparação do solo, adubação orgânica e montagem do sistema de irrigação.
A multiplicação de sementes da paixão (crioula) tem sido uma prática realizada no Assentamento. Durante o período de isolamento social, as famílias plantaram coletivamente sementes de girassol, milho, feijão verde ligeiro e amendoim, todas sementes crioulas que foram armazenadas no banco comunitário.
Durante a oficina, facilitada por Madalena Medeiros do Centrac e Ana Elisa Oliveira da Aspta, foi apresentado o vídeo “Não planto transgênico para não apagar minha história”, seguido de um debate sobre a ameaça dos transgênicos as sementes crioulas e a construção coletiva de estratégias para conservação das sementes crioulas. “A estratégia é não plantar as sementes perto, eu plantei a semente do meu milho em um terreno com mais de 500 metros de distância do vizinho e com uma ladeira no meio. Deu certo! A semente não cruzou. Eu peguei a semente no banco, plantei, lucrei e trouxe de volta pro banco”, contou o agricultor José Maria da Silva, presidente da Associação de agricultores do Assentamento Dom Marcelo.
“Eu já tive experiência no meu terreno, já plantei um milho numa parte e meu genro plantou um milho transgênico perto. Na época eu conversei com ele que os milhos iam se cruzar e eu ia perder minha semente. Quando fiz o teste, meu milho deu transgênico porque houve o cruzamento da minha semente com a dele. Agora já disse a ele que perto do meu terreno ele não planta mais”, afirmou a agricultora Maria José Rodrigues.
De acordo com a assessora técnica da Aspta, Ana Elisa Oliveira, “Isso acontece porque o milho é uma planta muito namoradeira, ele cruza com ele mesmo e cruza com os vizinhos e isso é um perigo para as sementes crioulas. Porque a contaminação é muito rápida. A ideia do projeto é que vocês tenham mais autonomia sobre as sementes, que não precisem comprar porque a gente sabe que a semente está muito cara”, disse.
Para evitar a contaminação das sementes na comunidade, os agricultores e agricultoras levantaram algumas sugestões, tais como: plantar afastado de outros roçados, selecionar e guardar as sementes para não precisar comprar no ano seguinte, não plantar sementes desconhecidas, não usar máquinas coletivas para debulhar, armazenar as sementes que servirão para o plantio e fazer campos de multiplicação.
“Todo plantio tem um sistema diferente, é preciso conhecer a época de plantar, o tempo da chuva, se precisa de pouca água ou muita água, o tipo da terra e não precisa usar de veneno. Essa é uma semente boa e que vale a pena a gente comer”, ressaltou o agricultor Severino do Nascimento.
No segundo momento da oficina, Madalena Medeiros do Centrac relembrou o planejamento realizado em fevereiro no Assentamento: escolha do local, cuidados com a área, cercas para evitar que os animais entrem, espaçamento, número de plantas por cova, definição e organização dos materiais necessários, preparo do solo e adubação orgânica. O outro passo foi o monitoramento e as pragas que podem atacar o plantio nesse período, como o gafanhoto e a lagarta que as são mais frequentes na região.
Para saber se a semente vai produzir bem, foi realizado um teste de germinação durante a oficina, feito com guardanapo, semente de milho e água. “O ideal é que nós façamos o teste para identificar o percentual de germinação. Coloquei 30 sementes de milho aqui e a gente vai avaliar o percentual de germinação. O ideal é ir para o campo sementes que apresentem percentual acima de 50%”, afirmou Madalena Medeiros.
Na prática, os participantes foram até o campo de multiplicação, que funciona com sistema de irrigação por gotejamento. No campo foi instalado um pluviômetro, para medir a intensidade das possíveis chuvas. Isso permite que os agricultores/as possam medir a quantidade de água de chuva e economizar na irrigação. Como encaminhamentos, foram divididas as equipes para monitorar a irrigação diariamente, o desbaste, a limpa e o controle de pragas e doenças.
O Projeto Agrobiodiversidade do Semiárido – é desenvolvido em 5 estados do Brasil. Na Paraíba, é realizado no território do Polo da Borborema, com a assessoria da ASPTA Agroecologia e no território do Fórum de Lideranças do Agreste (Folia) que conta com assessoria do Centrac e tem apoio financeiro do BNDES Embrapa e a Articulação do Semiárido Brasileiro.