Participaram da Audiência organizações da sociedade civil como o CENTRAC, o Movimento de Trabalhadores Sem Terra (MST), representante do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), famílias assentadas da Reforma Agrária do município de Campina Grande, Ministério Público Federal (MPF), representações do Governo do Estado da Paraíba, da Assembleia Legislativa e do Conselho Estadual de Direitos humanos.
A Câmara Municipal de Campina Grande parou para debater o tema da energia solar nesta quinta (16). A audiência pública foi uma propositura da vereadora Jô Oliveira (PC Do B) e do vereador Anderson Pila (PODE).
Em questão, a instalação do sistema de produção de energia solar. A necessidade surgiu, principalmente, a partir da demanda do Movimento dos Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais Sem Terra da Paraíba (MST-PB), que analisa de forma positiva a produção da energia solar, porém, problematiza a atuação das empresas privadas nesse processo.
Com a roupagem de instalar energia renovável nas áreas de assentamento, a iniciativa privada está causando uma série de problemas para as assentadas e assentados da reforma agrária da região do semiárido, o que alertou para a necessidade de colocar em debate o tema.
Para vereador Anderson Pila (PODE), refletir sobre esse tema é importante porque aparentemente ele chega como uma solução para os problemas do campo. “Será que a solução dos problemas do campo é parar de produzir? É a gente industrializar o campo? Quais os impactos ambientais que trazem essas placas solares para esses ambientes? Será que essa terra vai continuar sendo produtiva? As pessoas que estão ali estão no campo, são assentados, eles têm a posse daquele terreno, a posse daquela propriedade porque quando acamparam, toda argumentação era que aquelas terras não estavam cumprindo a sua função social. Então os acampados passam a ter direito para poder produzir nessa terra. E quando essa empresa implantar, tem que parar essa produção para gerar energia solar. Será que os agricultores vão ter direito a essa terra ainda? Quais garantias que o contrato traz para esses agricultores?”, questionou.
O projeto propõe a instalação das placas solares em assentamentos que são acompanhados pelos MST, que é a favor da implementação, no entanto, questiona pontos, a exemplo de cláusulas no contrato que exigem a titulação de posse, transformando os assentados em “comodatários”. Também pauta a preocupação ambiental, visto que a região semiárida possui ciclos irregulares de chuva e como consequência futura, as placas solares podem modificar ainda mais com o possível desmatamento da região e o aumento da temperatura.
Outra preocupação está voltada para a produção das atividades agrícola e agropecuária, o beneficiamento da terra garante a continuidade da agricultura familiar, fortalece a rede de economia solidária e realiza a produção a partir da agroecologia, respeitando os diversos ecossistemas de produção. Logo, a partir da instalação, a principal atividade do lote deixaria de ser a Agricultura Familiar.
Os estudos apresentados na audiência pelo professor John Cunha pontuam dois fatores: A regulação da umidade do ar (evapotranspiração) e o sequestro de carbono. Contextualizando que este impacto pode gerar a mudança climática que como consequência traria a redução de espécies, perda de nutrientes e umidade do solo, desertificação do solo, dentre outros impactos.
Também esteve presente a Deputada Cida Ramos, a mesma fala sobre a percepção de que tornar a terra própria para viver, colocando a preocupação com a terra. Ressalta que o Nordeste dispõe de grandes potencialidades para a produção de energias solares, diante de seu mandato, afirma que: “[…] nós não vamos permitir que algo que pode se transformar numa vocação da Paraíba Econômica, que pode se tornar a maior política pública de emprego e renda para o povo da Paraíba, se torne um cavalo de troia para os pequenos agricultores, para os assentados, se eles chegam num dia prometendo e querendo roubar a consciência, a unidade e a força desses assentados, terá no meu mandato barreira para que impeça que eles roubem o que de nós temos de melhor. Nós queremos sim energia solar, mas como política pública para fortalecer os assentamentos, para que consigam plantar e matar a fome do povo paraibano e brasileiro.”
Para tentar resolver o problema, a vereadora Jô Oliveira (PC do B) sugeriu a criação de um conselho que viabilize a fiscalização sobre as questões energéticas para ampliar a perspectiva de diálogo com outros setores da Prefeitura Municipal de Campina Grande, envolvendo os professores das universidades e os assentamentos para colaborarem com o fortalecimento deste debate.
O debate foi aprofundado pela dirigente nacional do MST, Dilei Schiochet, que reforça a preocupação sobre as consequências deste projeto, para além dos pontos já postos em debate. Dilei reforça a importância de pensar na vida e não só na vida humana, mas também nos ecossistemas de vidas. “A privatização dos recursos naturais da terra e do sol, significa apagar a vida no planeta, nós que viemos lutando pela terra, a luta pela democratização da terra a gente começa a se deparar com um outro grande problema que é de agora tá aqui discutindo sobre sol e a energia”, disse Dilei.
O MST-PB também elencou a importância de descobrir quem está por trás deste projeto, visto que a empresa responsável usa o nome vulgo de Rocha Cavalcante e se trata de uma prestadora de serviços responsável pelos contratos que estão sendo levados aos assentados, sendo desconhecido o proprietário da iniciativa.
Sobre as responsabilidades sociais, Dilei pontuou que destruir mil hectares de terra em Venâncio Tomé, desapropriar as 380 famílias que vivem assentadas em Campina Grande é destruir a vida. Ela problematizou os procedimentos já realizados pela empresa Rocha que fechou contrato com assentados sem que os mesmos tivessem a oportunidade de realizarem um debate para esclarecer o contrato e questionou setores da gestão pública, a exemplo de funcionários do Incra e da Prefeitura de Campina Grande, que deveria prestar serviços de assessoria aos assentados mas está compactuando com o projeto de privatização do sol, enquanto recurso natural.
Dilei finalizou sua contribuição no debate com a reflexão: “e sabe qual é a punição que temos que dar? Vão lá recuperar os mil hectares de terra que vocês destruíram, não precisa exonerar, não. Bota eles para produzir e plantar árvores, botem eles para recuperar a natura, botem eles para trabalhar debaixo do sol, como Marcos acorda às 04 horas da manhã. Botem eles para refazerem a natureza, e por último, nós precisamos também criar uma comissão aqui na Câmara, para discutirmos junto ao poder público e a sociedade civil, nós não podemos admitir que o dinheiro público possa ser destinado para o grande capital. o dinheiro público deve estar destinado para construir uma política público, p or isso lutamos para que esse país seja soberano. Privatizar o sol e a terra é apagar as vidas humanas […] por último, alguém daqui produziu terra? Produziu água? Alguém produziu o sol? Se ninguém produziu ela não pode ser mercadoria e devem estar a serviço do povo e da soberania dos brasileiros e brasileiras, portanto, as riquezas naturais não podem ser mercadoria, não podem ser comercializadas e nem vendidas. Fora o capital e as empresas multinacionais que querem se apropriar das riquezas do povo brasileiro.”
Confira o vídeo da audiência, acesse: https://www.youtube.com/watch?v=wVhO3o7PJQQ
Fonte: Brasil de Fato