Famílias agricultoras dos Assentamentos José Antônio Eufrouzino (Logradouro e Monte Alegre) e Pequeno Richard em Campina Grande-PB participaram do ciclo de formação sobre a “Divisão sexual do trabalho no agroecossistema familiar e a importância da participação das mulheres nos espaços de decisão”, promovido pelo Centro de Ação Cultural – CENTRAC nos meses de julho e agosto.
A atividade teve como objetivos refletir com as famílias sobre o uso do tempo e problematizar a divisão sexual do trabalho no agroecossistema familiar; problematizar as relações que se estabelecem entre homens e mulheres no cotidiano comunitário e formular compromissos que possibilitem as mudanças positivas na interação entre homens e mulheres na vida cotidiana e comunitária.
Durante as formações, mulheres e homens realizaram um exercício de avaliação do uso do tempo no dia a dia da família, através do registro das atividades no decorrer de 24h. A rotina das mulheres começo muito cedo e segue até próximo à meia noite, intercalando a lida com o roçado e os animais, com os cuidados com família e as tarefas domésticas, que são feitas sem a contribuição dos homens. “O trabalho doméstico só é visto quando ele não é feito. Nós cuidamos das crianças, da pessoa idosa, da pessoa doente, da mãe, da sogra e esse trabalho de cuidado tem sido sobrecarregado ao longo da nossa vida, mas esse trabalho não é reconhecido, mas é essencial para a reprodução e manutenção da vida”, ressaltou a assessora técnica do CENTRAC, Patrícia Sampaio.
Nos encontros as mulheres refletiram sobre os trabalhos realizados em casa e no roçado e como as desigualdades são impostas pelo sexo: o que é dito como tarefa de homem e tarefa de mulher. “Eu tenho 33 anos de convivência com meu marido, no início não foi fácil. Quando eu trabalhava fora de casa, eu sempre dizia que tava sobrecarregada, não dava conta de tudo sozinha. Um dia tive que cuidar do meu filho que adoeceu e passei 15 dias no hospital. Meu marido teve de cuidar de tudo, cuidar da casa, do roçado e fazer comida. Foi quando ele percebeu que não é fácil e aos poucos fui mostrando que se os dois fizessem juntos tudo fica bem melhor”, contou a agricultora Maria José Vidal, do Assentamento José Antônio Eufrouzino.
“Cada oficina e formação que a gente participa, a gente aprende. Faz 14 anos que estou casada e sempre dividimos tudo. Isso vale pros casais mais novo. Se os dois aprendem a dividir, vai ser sempre melhor pra toda a família”, contou a agricultora Maria da Conceição, do Assentamento José Antônio Eufrouzino.
Através da representação de uma árvore, Patrícia apresentou os pilares para a sustentabilidade da vida e a divisão se estabelece entre trabalho produtivo e reprodutivo. As raízes são representadas pela natureza, o trabalho doméstico, a casa, o cuidado, um trabalho que geralmente é realizado por mulheres e invisibilizado. Na copa da árvore, tem-se o trabalho produtivo, que é visível e envolve a comunidade, os espaços públicos, a política, o estado, o mercado e é dominado pelos homens. “A gente precisa equilibrar essa árvore. Reajustar o tempo para dar sustentabilidade a vida. Se mulheres trabalham mais no cuidado e no trabalho doméstico, esse trabalho precisa ser reconhecido”, porque também contribui para o bem-estar e desenvolvimento da família e da sociedade, ressaltou Patrícia.
O exercício ajudou a refletir sobre a importância do trabalho realizado pelas mulheres, tanto no cuidado, nos afazeres domésticos como agroecossistema familiar, com o cultivo de plantas medicinais, hortaliças, fruteiras, criação de pequenos animais nos quintais, espaços de gestão e autonomia das mulheres. Constatar que esse trabalho contribui para a segurança alimentar e nutricional de toda a família, sustenta a vida, ajuda a valorizar o trabalho desenvolvido pelas mulheres. “Eu nem me dava conta que a fazia tudo isso” (Zélia de Melo Duda, Assentamento Pequeno Richard).
Ao término de cada formação, mulheres e homens construíram estratégias para diminuir a carga de trabalho das mulheres e meninas, que desde cedo seguem os passos das mães e melhor distribuir as atividades de cuidado e trabalho doméstico na família.
“É importante que a gente ensine os filhos da gente, a respeitar as meninas, a ajudar em casa, a lavar uma louça, forrar uma cama. Isso não vai tonar ele menos homem no futuro, pelo contrário, vamos ter homens que vão ser mais companheiro das mulheres”, contou a agricultora Ilma Elias, do Assentamento José Antônio Eufrouzino.
O agricultor Helder Vieira participou da formação junto com a esposa e reforçou que os homens podem cuidas mais das crianças, botar elas para dormir, dar um remédio. Isso ajudaria a diminuir a sobrecarga das mulheres no dia a dia.
A atividade faz parte das ações do Projeto “Fortalecimento de sistemas alimentares com mulheres no Semiárido paraibano” realizado pelo CENTRAC com o apoio da organização espanhola Manos Unidas.