“Nós estamos aqui para construir, com participação popular, a democracia e o controle social”, ressalta coordenadora da ASA-PB

Publicado por Thaynara Policarpo
Campina Grande, 12 de setembro de 2022

“Eleições 2022: A Paraíba em defesa de um Semiárido Vivo” promoveu encontro de cerca de 500 agricultoras /es com três candidatos ao governo do Estado e Senado, em Campina Grande 

Lindalva de Oliveira e o marido José Antônio vieram de Mogeiro, no Agreste da Paraíba, para Campina Grande. Um pouco mais de 51 km separam os centros das duas cidades. O casal faz parte da associação do assentamento Dom Marcelo Pinto Carvalheira, onde vivem. Ela vice-secretária. Ele vice-presidente.

Rita Maria de Santana Silva e José Expedito Arruda foi outro casal que viajou mais de 60km do seu sítio para participar do encontro que a ASA Paraíba realizou com os candidatos ao governo do Estado, na sexta-feira passada (9) pela manhã. Eles moram na zona rural de Aroeiras e são vendedores da feira agroecológica do município. Com eles, residem cinco dos sete filhos. “Todos solteiros e só um com um trabalho”, contou Rita.

De mais distante, veio Antônio Tavares, agricultor do Alto Sertão paraibano. Ele percorreu quase 300 km para se fazer presente no evento que reuniu cerca de 500 agricultores e agricultoras dos sete territórios de atuação da ASA Paraíba.

“Saí de casa hoje de 1h da manhã. Sou agricultor dedicado ao trabalho em comunidade. Venho no intuito de representar minha comunidade e município. A gente depende da política. E precisamos do gestor, assim como ele depende de nós. A gente precisa escolher um candidato que não sirva só a si, mas a todos”, destacou Antônio, que faz parte do conselho do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Aparecida.

Lindalva, Rita, José Antônio, José Expedito e Antônio sabem da importância do voto consciente e isso os motivou a encarar o deslocamento, deixar os afazeres de casa, do roçado, do quintal, com os animais e dedicar o dia ao ato “Eleições 2022: A Paraíba em defesa de um Semiárido vivo!”. Como lideranças e membros de coletivos de agricultores e agricultoras, eles representam outras tantas famílias de suas comunidades e municípios.

Diante do público que encheu o salão da AABB, em Campina Grande, três candidatos, sendo dois ao senado – Ricardo Coutinho (PT) e Alexandre Soares (PSOL) – e um a governo do Estado – Veneziano Vital do Rego (MDB) – ouviram sete agricultores e agricultoras, todos lideranças de vários territórios do Semiárido.

Cada um/a dos sete porta-vozes anunciava as pautas importantes dos temas estratégicos para a Articulação Semiárido: criação animal, água, mercados, sementes da Paixão, mulheres, juventudes e bem viver. Reginaldo Bezerra, Sérgio Oliveira, Euzébio Cavalcanti, Maria do Céu Silva, Mateus Manassés e Roselita Vitor apresentaram pleitos essenciais para que as famílias agricultoras tenham condições de viver com dignidade em seu pedaço de chão, apesar dos reveses climáticos que se tornam cada vez mais frequentes por conta da mudança na temperatura global.

Além das demandas, algumas denuncias, como a posta por Sérgio Oliveira. “A gente não abre dos programas de acesso à água com formação e assessoria técnica. E também não abrimos mão de implementar as tecnologias sociais valorizando os acúmulos das entidades das organizações da sociedade civil e caráter produtivo, prioritariamente, para mulheres e jovens, para garantir que os jovens saiam do campo. A gente atravessou dez anos de seca severa e não houve deslocamento humano por falta de água, por causa de um simples programa de cisterna que garantiu soberania alimentar e nutricional, soberania hídrica e deu dignidade a essas pessoas que não precisam trocar o voto por um carro pipa de água”.

Os pleitos proferidos foram construídos coletivamente pelos participantes da ASA Paraíba em diversos momentos. Um deles foi na quinta-feira passada (8), em Campina Grande. “Nós aprendemos, na nossa história, que o Semiárido da Paraíba e o Semiárido brasileiro não quer viver mais de migalhas. Nós aprendemos, sempre, que nós temos a capacidade de sermos sujeitos de nossa própria história quando a política pública é canalizada para fortalecer a autonomia dos sujeitos do Semiárido. Isso é Bem Viver no Semiárido”, proferiu Roselita Vitor abrindo a sua fala, que encerrava o ciclo de apresentação dos pleitos registrados na Carta da ASA Paraíba às candidaturas.

“O programa Um Milhão de Cisternas é um exemplo de uma relação forte entre a sociedade civil e o poder público na construção de políticas. A ASA é reconhecida por essa política no Brasil e fora do Brasil. Nós queremos construir um plano de agricultura familiar com base agroecológica para o Semiárido da Paraíba com a participação da sociedade civil organizada”, destacou Rose e seguiu enumerando outros pleitos como a criação de um programa estadual de assessoria técnica rural (ATER) com bases agroecológicas em parceria com a sociedade civil.

“Nós entendemos, enquanto sociedade, que não queremos apenas receber as políticas, queremos construir as políticas e nós queremos participar dessa construção”, defendeu. Mais à frente, Rose pauta a construção de um canal de diálogo permanente da sociedade civil com o governo. Logo em seguida, ela traz à tona a questão das energias renováveis, que também havia sido citada na fala de Mateus Manassés, porta-voz dos pleitos da juventude.

“Nós, enquanto Articulação do Semiárido, nós, enquanto Articulação Nacional de Agroecologia, somos a favor das energias renováveis. Achamos que esse é o caminho porque o nosso planeta não suporta mais ser sugado. Mas, o programa de energia renovável, no Brasil e no estado da Paraíba, tem sido uma forma de violar os direitos das comunidades rurais. As usinas eólicas e solares são um modelo centralizado de energia e esse modelo desmata a Caatinga que já vem num processo grave de desertificação e agrava as questões ambientais, quando a gente pensa hoje nas mudanças climáticas”, ressalta elencando a seguir algumas questões que estão na carta da ASA-PB.

Antes de passar a voz para os candidatos presentes, houve ainda uns versos declamados por Lita Bezerra, agricultora experimentadora referência na Paraíba, produtora de medicamentos naturais, rezadeira e mestra na arte da poesia. E uma fala de Glória Batista, uma das coordenadoras da ASA PB, que destacou a importância do momento dizendo que “esse é o encontro do povo, do poder popular, com os candidatos. As falas que vieram das agricultoras e dos agricultores é a força do povo. É aquilo que sai do desejo, da construção coletiva da agricultura familiar camponesa. Nós não fazemos convivência com o Semiárido não só com tecnologia, mas com cultura popular, com conhecimento popular”.

E ressaltou que a intenção maior da carta da ASA é enfrentar a fome. “A gente sabe que a fome já chegou a mais de 33 milhões de brasileiros e brasileiras. Isso não é à toa. É falta de vontade política. Então, os agricultores que falaram, os que estão aqui e outros que ficaram em casa, disseram que queremos enfrentar a fome, mas com participação popular, promovendo soberania e segurança alimentar. E, pra isso, precisamos trabalhar com as sementes da Paixão vegetal e animal, fazer com que a agricultura familiar camponesa tenha acesso as políticas públicas, tenha recursos e que também a gente possa enfrentar todas as formas de violência que aqui foram colocadas.”

Glória destacou também o sentido de estarem presentes: “Nós estamos aqui para garantir e continuar construindo, com participação popular, a democracia, o controle social que é necessário, após a vitória dos futuros deputados e deputadas, senadores, para a construção de políticas públicas. A gente conseguiu acesso às políticas públicas, nesses mais de 500 anos de latifúndio, nos governos de Lula e Dilma. Foi quando veio um pouco de recurso para a agricultura familiar, gente! Isso é constatado em pesquisas, mas é vivido, sobretudo, pelas famílias agricultoras do Semiárido brasileiro. As mudanças que ocorreram foi porque tivemos dois governos populares que tinham que abrir diálogo com a população. E abrir diálogo com a população não era só construir cisternas, mas também trazer o nosso jeito de fazer, valorizando os conhecimentos e saberes das agricultoras e agricultores”, afirmou.

Em seguida, foi a vez dos candidatos presentes dialogarem com as pautas apresentadas. A assinatura das cartas da ASA Paraíba, ASA Brasil, Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e da Marcha das Margaridas foi realizada logo após cada fala.

A iniciativa – O diálogo proposto pela ASA na Paraíba é uma iniciativa que está acontecendo em vários territórios do Semiárido. Articulações como a ASA, a ANA e a Rede Ater Nordeste de Agroecologia estão estimulando esses processos de incidência política para que as pautas que dizem respeito à produção e acesso aos alimentos de verdade e livres de venenos estejam na prioridades dos programas e políticas públicas em todas as esferas governamentais – país, estados e municípios – além de estar na agenda do Legislativo nos três níveis.

Confira as cartas-compromisso:

ASA Brasil – https://drive.google.com/file/d/19GRtmv8yi3wHRDIW2E0KqbrVS-Pj8O-2/view

ANA – https://agroecologia.org.br/agroecologia-nas-eleicoes/

ASA PB – https://centrac.org.br/download/carta-da-asa-pb-a-paraiba-em-defesa-de-um-semiarido-vivo/

Marcha das Margaridas – https://www.fetape.org.br/imagens/documentos/carta-marg.pdf